quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

História e Arqueologia - Finley (cont. 2)

Para Finley "(...) a questão não é simplesmente correlacionar provas arqueológicas e literárias, mas usar a Arqueologia para comprovar se , e até que ponto, a Literatura tem algum valor. " 

Claro que a Arqueologia serve pra muito mais que isso. Porém Finley tem alguma razão em como ela não consegue determinar Sistemas Sociais e Relações Religiosas, coisa  que os lembretes de Pigott reafirmam muito bem. A Arqueologia é composta de 

a) Restos

b ) Restos Duráveis

c) Chegados até nós acidentalmente. 

Alguém que passe anos estudando o Egito sem o devido cuidado, chegará à conclusão de que os Egípcios só construíam habitações em pedra. O fato óbvio é que a pedra sobrevive mas as choupanas de madeira, palha e juncos dos habitantes mais pobres, não.   

Como sabemos dessas choupanas ? Sabemos por que alguém escreveu sobre elas. E claro, podemos inferir também - o que é uma prova bem menos segura. 

A Arqueologia não nos dá um retrato preciso de relações sociais ou mesmo de camadas e grupos de uma sociedade, até por que nem é essa ou nem deve ser, a função ou intenção da Arqueologia.

Serve para comprovar as fontes escritas ? Sim, embora sirva mais para descartá-las como no caso em que estudo atualmente, os povos não-gregos da Sicília. Todos os historiadores gregos - fontes literárias - afirmam que os Sícelos vieram da Itália. A Arqueologia nunca comprovou isso e com razoável margem de segurança pode desmentir meia dúzia de fontes escritas que provavelmente se basearam umas nas outras.


História e Arqueologia - Limites (cont.)

Se a crítica de Finley foi sobre um hiperuso da Arqueologia para responder questões que não se aplicam, ele a complementa de modo contrário, lembrando que não se pode prescindir da Arqueologia. 

"Tampouco vejo maior virtude, como já afirmei, no comportamento de historiadores, que negligenciam materiais arqueológicos. E talvez eu deva repetir, que de todas as evidências disponíveis, é impossível deduzir organizações ou instituições sociais, atitudes ou crenças tomando por base unicamente objetos materiais."

A postura de Piggot, que Finley apresenta no início de seu artigo como suporte ao que desenvolverá é assim escrita no trabalho que citamos -  Ancient Europe (1965). 

Pode parecer "uma doutrina severa para algumas pessoas (...) os dados baseados na observação da pré-História [sempre lembrando que este conceito, na época que Pigott escreve, se referia a períodos sem escrita] parecem-me em todos os sentidos, mais ambíguos e mais suscetíveis a interpretações variadas do que a gama normal de materiais disponíveis para os historiadores. O que temos à disposição como pré-historiadores são remanescentes duráveis da cultura material que chegaram acidentalmente até nós, os quais interpretamos da melhor maneira possível e inevitavelmente a qualidade peculiar dessas evidências dita o tipo de informação que podemos obter delas. Além do mais interpretamos as evidências em termos de nossa formação intelectual, que é condicionada pelo período e cultura nos quais fomos educados, nossa bagem social e cultural, nossas hipóteses e pressupostos atuais e nossa idade e posição social."


quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

História e Arqueologia.

Em obra da década de 70, discutindo livros da década de 60 do século XX, Moses Finley consegue chamar a atenção para alguns limites do que a Arqueologia pode fazer - limites que hoje me parecem estar sendo esquecidos.

É certo que hoje temos mais técnicas, métodos, tecnologia mais avançada, e certamente alguns dos problemas que Finley levanta foram parcialmente superados.

Mas as questões de método e formulação dos problemas valem como avisos quando buscamos respostas apenas nos objetos - a refutação das vênus esteatopígeas como símbolos de um culto à fertilidade é um bom exemplo para iniciar a discussão.

A seguir, alguns trechos de Finley - Uso e Abuso da História , Cap. 5 História e Arqueologia

"Por exemplo, sabemos que através da preservação casual de relatos inscritos na pedra, que o mais delicado entalhe feito em pedra no templo de Atenas, conhecido como Erectêion, foi criado no fim do século V a.C. por homens e escravos trabalhando lado a lado. Nada no material que chegou até nós (o próprio entalhe) poderia nos ter dito isso. Por outro lado, os relatos de que dispomos sobre o templo de Apolo em Epidauro, construído cerca de 30 ou 40 anos depois, são de uma natureza tal que a força de trabalho não está especificada. Como imagina Binford poder descobrir se foram ou não empregados escravos, de alto grau de habilidade, nesse templo ?"

R. I. Binford é um arqueólogo que Finley inclui entre os 'reformadores' que se propunham a superar o momento de crise da Arqueologia na década de 60, mas que não eram tão pessimistas quanto Stuart-Piggot acerca das interpretações possíveis sobre artefatos da cultura material da pré-História (ou aquilo que se convencionou chamar de pré-História até estes debates, os períodos para os quais não havia relatos escritos).

Piggot declara que elementos da cultura material são altamente sujeitos a interpretações dúbias - tese que Finley segue. As posturas de Piggot a esse respeito estão resumidas na introdução de sua obra Ancient Europe (1965).